top of page
Foto do escritorLucas Munt

Baixa adesão ao Campinas Protege: famílias desconhecem auxílio


Foto: Acervo FEAC

A Câmara Municipal de Campinas aprovou uma lei pioneira de auxílio financeiro às vítimas de orfandade por conta da COVID-19. A medida, denominada "Auxílio Campinas Protege", é temporária e de caráter emergencial, com previsão de R$1,5 mil pagos uma única vez para cada família atingida. Entretanto, a promotora Andrea Santos Souza, que acompanha a execução do projeto, disse que a cidade paulista precisa avançar ainda mais e garantir um benefício individual para cada criança atendida.


A Lei nº 16.135, que garantiu uma ajuda paga em três parcelas de R$500 para cada família e o subsídio independe do número de crianças herdadas, frustrou a promotora. Isso porque as famílias que acolhem duas ou mais crianças recebem o mesmo valor das que amparam somente uma família, quantia que Andrea Souza considera insuficiente para as famílias que possuem mais de uma criança sob tutela. Pela lei sancionada no dia 15 de novembro de 2021, serão beneficiárias as famílias que registraram óbito de um ou ambos os pais, tenham domicílio fixado há pelo menos um ano em Campinas e que tenham renda de até meio salário mínimo. Além disso, a prefeitura de Campinas registrou baixa procura pelo Auxílio Campinas Protege. O benefício estava estimado para atender 350 famílias, porém somente 27 foram atendidas até o momento. A secretaria chegou a procurar beneficiários através de serviços de assistência social e SMS.


A baixa adesão ao programa "Auxílio Campinas Protege" pode ser atribuída a diversos fatores. Primeiramente, a falta de conhecimento e divulgação adequada sobre o programa pode ter dificultado o acesso e a participação dos cidadãos elegíveis. Além disso, questões relacionadas à burocracia também podem ter contribuído para a baixa adesão. As restrições impostas pelo programa, como renda mínima ou critérios específicos de elegibilidade, podem ter excluído uma parcela significativa da população que está enfrentando dificuldades financeiras, mas não se enquadra nos critérios estabelecidos.


No entanto, lidar com a orfandade causada pela COVID-19 não é uma tarefa simples. Requer ações integradas de diferentes setores da sociedade, como saúde, assistência social, justiça, educação e organizações da sociedade civil. É imprescindível que haja um esforço conjunto para desenvolver estratégias de proteção e suporte eficazes, a fim de mitigar o impacto dessas perdas no desenvolvimento e no futuro dessas crianças.


“No final de 2020, comecei a notar um aumento nos pedidos de guarda por causa do falecimento do guardião anterior em decorrência da Covid-19. Era importante entender mais sobre essa situação, então decidi começar uma pesquisa em certidões de óbito”, conta Andrea a respeito do início do projeto.


MP localizou 500 órfãos


A promotora recebeu mais de um ano de certidão de óbito, constando cerca de 3 mil, em Maio de 2021, Ela e uma equipe verificaram um por um e afirmaram que foi um trabalho desgastante e bastante depressivo, mas muito importante. Um levantamento foi feito nesse primeiro momento e foram localizadas cerca de 500 crianças em Campinas que tinham perdido pai e mãe, ou até mesmo os dois.


Andrea Santos Souza instaurou um procedimento na promotoria de Campinas em Maio de 2021, que consiste em 3 desafios, ou eixos: Localização e identificação das crianças, garantia de segurança alimentar e material e saúde mental. O primeiro eixo compreende identificar e localizar crianças e adolescentes vítimas de orfandade, foi utilizado o conceito ampliado de orfandade (CRC) incluso na convenção da ONU dos direitos da criança para verificar quais são as crianças privadas dos cuidados parentais. O procedimento localiza e identifica menores vítimas de orfandade unilateral, bilateral ou perda do principal cuidador. Verificar a representação legal era um desafio importantíssimo, visto que podem ocorrer adoções irregulares, separação de irmãos e de institucionalização. Além disso, analisar, o risco de evasão escolar, de exploração do trabalho e de casamento infantil.


No segundo eixo, consta a garantia da segurança alimentar e material. Dessa forma, é necessário verificar as condições em que se encontram essas crianças e localizar eventuais propriedades, herança ou benefício deixado pelos pais e assegurar que sejam administrados em favor do infante.


O terceiro eixo consiste na saúde mental. Somente o apoio financeiro não confortará ou amenizará a dor do luto. É imprescindível o apoio psicológico para todos aqueles que perderam seus cuidadores. A necessidade de respeitar o luto da criança e a garantia do direito à memória dos pais são maneiras de atenuar a dor. Dessa maneira, é imprescindível a capacitação da rede de proteção, para identificar comportamentos agressivos ou depressivos a partir de um acompanhamento psicológico constante. Fomentar também, a criação de um atendimento especializado junto ao CAPSi— Centro de Atenção Psicossocial Infanto Juvenil— e profissionais da rede de saúde mental e a criação de um memorial em homenagem às vítimas de covid no município.


A partir desses desafios, foram traçadas estratégias para garantir os direitos das crianças e adolescentes vítimas de orfandade no interior do estado de São Paulo. Para identificação e localização, a análise das certidões de óbito recebidas dos registros civis, foram localizadas 455 crianças, duas em orfandade bilateral, 7 com menos de um ano de idade e 60 na primeira infância. Solicitar informações junto aos serviços da rede de proteção para localizar menores que perderam seus guardiões. Atualmente ainda estão procurando crianças que perderam seus cuidadores secundários. Esses são mais difíceis de localizar, pois não constam na certidão de óbito. Então deve-se recorrer ao conselho tutelar ou alguma outra entidade que cuide dessas crianças e verificar com o Ministério Público do Trabalho a possibilidade de reserva de cotas em programas de aprendizagem para adolescentes atingidos pela orfandade.


No estado do Maranhão, ao realizar a certidão de óbito, os cartórios são instruídos a perguntar se a pessoa falecida tinha algum menor sob sua guarda. Caso a resposta seja positiva, a certidão de óbito é encaminhada imediatamente para o serviço de assistência social. Essa informação agiliza o processo de assistência social, possibilitando uma resposta mais rápida e eficaz em casos de vulnerabilidade infantil.


No entanto, em São Paulo, essa prática ainda não está em vigor, o que dificulta a localização e identificação das crianças em situação de desamparo. A inclusão da informação sobre a guarda de menores nas certidões de óbito brasileiras, por mais que tenha como objetivo principal, atender a questões patrimoniais, também pode ser de grande auxílio na identificação e localização de crianças em situações vulneráveis. Através da união de esforços entre órgãos governamentais e instituições de proteção, é possível fortalecer a rede de assistência e promover um ambiente seguro e acolhedor para as crianças brasileiras.


A superação das consequências dessa crise humanitária demanda não apenas ações imediatas, mas também um investimento de longo prazo no fortalecimento dos sistemas de proteção social, no combate à desigualdade e na promoção de condições dignas de vida para todas as crianças brasileiras.

0 comentário

Comments


bottom of page