O governo federal vai criar um sistema de atendimento prioritário no SUS para crianças e adolescentes órfãos vítimas de feminicídio, de pandemias, de desastres naturais ou de outros tipos de violência. Uma minuta, com detalhes sobre o projeto foi elaborada pela Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos (Aespar) do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). O programa também propõe o fim do contingenciamento de recursos destinados à atenção a esse público, bem como a oferta de linhas de cuidado voltadas à proteção da saúde mental dos órfãos.
A minuta diz que os meios de captação para o atendimento prioritário serão pelos fundos nacionais, estaduais e municipais dos direitos da criança e do adolescente. Também serão consideradas distribuições com destinações específicas aos órfãos a partir do “Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária e do Plano Nacional pela Primeira Infância". Ainda não há detalhamento na sobre os benefícios previstos.
A minuta
O projeto compreende vítimas de feminicídio, de pandemias e de desastres naturais. O documento passou por avaliação na Secretaria da Criança do MDHC e passará por consulta pública ainda em breve. Após a consulta, o PL será debatido pela Casa Civil e por todos os ministérios pertinentes.
A proposta parte da consideração de que crianças e adolescentes em situação de ameaça e violação de direitos previstos pelo “Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente” tenham atendimentos prioritários e protocolados pelos serviços públicos. Além disso, ela ressalta que as ações serão destinadas às crianças ou aos adolescentes órfãos vítimas de feminicídio, de pandemias, de desastres naturais ou de outros tipos de violência.
Outra ação prevista é a elaboração de linhas de cuidado voltadas para a preservação da saúde mental pelo SUS para aquelas que apresentam sofrimento psíquico grave e persistente, vítimas e testemunhas de violência e crianças em luto por situação de orfandade. O PL também ressalta que os Fundos da Criança de Adolescente não devem funcionar como instrumento de restrição orçamentária.
Na prática, o Sistema de Informação para a Infância e a Adolescência (SIPIA), coordenado pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente será encarregado por colocar em ordem toda a parte tecnológica através da criação de um banco de dados que apresentará estudos estatísticos e qualificará os casos de acordo com membros específicos do Conselho Tutelar.
Os próximos passos do Governo Federal
O Assessor Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos do MDHC, David Bichara, afirma que a minuta do projeto busca analisar lacunas para avanços no âmbito legislativo. Está prevista uma consulta pública com membros civis, e posteriormente com a Casa Civil, afirma David.
Estima-se que cerca de 40.830 crianças menores de 18 anos perderam suas mães durante a epidemia, segundo o levantamento do artigo “COVID-19 mortality in Brazil, 2020-21: consequences of the pandemic inadequate management”, divulgado pelo Observatório Infância. O estudo foi elaborado pelos pesquisadores Célia Landmann Szwarcwald (Fiocruz), Cristiano Siqueira Boccolini (Fiocruz), Wanessa da Silva de Almeida (Fiocruz), Adauto Martins Soares Filho (UFMG) e Deborah Carvalho Malta (UFMG).
A movimentação do projeto de lei foi consequência da comoção de membros de imprensas e de órgãos de assistência social diante dos números de órfãos brasileiros após a pandemia em 2020. No “Manifesto de Coalizão pelos direitos de crianças e de adolescentes sob orfandade da Covid-19”, criado em dezembro de 2021 pela imprensa e por Órgãos sociais, aponta-se as limitações do arcabouço legislativo e a necessidade da proteção integral dos órfãos, apesar do Relatório Final da CPI da Covid-19 ter previsto esse auxílio em outubro de 2021. A partir dessa movimentação foi percebido que, na verdade, as limitações previstas na constituição englobam qualquer tipo de orfandade desencadeada por diversos tipos de violências.
O Coordenador da Coalizão, Milton Santos, explica em uma entrevista exclusiva que o arcabouço legislativo não consegue criar um acompanhamento de fato efetivo.
“A gente tem percebido que essas leis não têm conseguido criar um sistema de acompanhamento e proteção que eu chamo de “imaterial”. Que é acompanhar efetivamente essas famílias em que o feminicídio aconteceu, entender os impactos psicossociais disso nos cuidadores e nas crianças e adolescentes órfãos, garantir que a rede de proteção opere. De modo geral, essas legislações têm esses problemas e algumas são muito restritas.”
Além disso, a Coalizão questiona os riscos da necessidade de definir orfandade e a necessidade de investimento no SIPIA.
Gestão de Grupo de Trabalho para promoção de auxílio ainda incipiente
David também comenta que um Grupo de Trabalho (GT) é gerido pelo MDHC e pelo MDS e que um auxílio ainda será definido, porém ainda não há data no calendário.
“Uma outra questão que eu estou participando lá pela Aespar, que é uma questão a parte, já está encaminhado um GT que vai envolver o Ministério dos Direitos Humanos, mas generados pelo MDS, que é uma política de atenção específica voltada para as crianças em situação de orfandade a partir da pandemia do Covid-19. Então, o formato dessa política, um auxílio, protocolos de atenção… Isso ainda vai ser definido. Ainda não tem um calendário para GT, mas o governo está trabalhando a todo vapor. São os entraves da burocracia. Mas acho que a gente em breve vai ter um calendário.”
Em agosto de 2021 o Nordeste anunciou o “Nordeste acolhe”, que visa a pagar R $500,00 por criança órfã da Covid-19 até o período da maioridade, mas cada estado tem autonomia para definir o valor, considerando sua disponibilidade financeira e orçamentária. Na região, a política pública de orfandade já funciona a partir do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos através do “Programa Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária”. Ele garante a convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes em situação de acolhimento institucional ou familiar, priorizando a reintegração familiar e a adoção.
A partir da consulta pública com a Coalizão pelos direitos de crianças e de adolescentes sob orfandade da Covid-19 prevista para essa semana, o PL passará pelas mudanças necessárias. A partir das movimentações da Aespar com o MDHC e o MDS, o documento busca fortalecer o Sistema de Direitos da Criança e do Adolescente a partir da contribuição pública para a proteção integral de todo o núcleo que envolve os órfãos brasileiros.
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